Uma visão extensiva do Princípio da Proporcionalidade
Não nos restam dúvidas de que o princípio da proporcionalidade, também conhecido como princípio da Proibição do Excesso, constitui um dos mais importantes ditames a nível da consagração de uma fronteira interna de discricionariedade administrativa que impõe a todos os órgãos ou agentes públicos uma ação adequada à prossecução do interesse público. Importa-nos também adiantar que este princípio assume, para além do seu papel determinante no direito administrativo, um lugar de destaque a nível do ordenamento jurídico no seu todo.
De facto, este princípio surgiu pelo meio do “Direito da Polícia” alemão, ligado principalmente à componente da necessidade, aliado à ideia de lesar o menor possível a esfera dos interesses e direitos dos particulares, na prossecução do interesse público. Partindo desta ideia consagrada, foi alargado aos demais ramos do direito administrativo, sendo até consagrado constitucionalmente na ordem jurídica portuguesa, dada a sua importância na consagração de um ordenamento mais justo e equilibrado. Deste modo, encontra-se consagrado no artigo 7º CPA (Código do Procedimento Administrativo), assim como no artigo 266º nº2 da CRP (Constituição da República Portuguesa) e no artigo 2º da CRP (Estado de Direito Democrático). O que estes artigos nos permitem reconhecer é que este princípio determina que, na prossecução do interesse público pelo Estado, os direitos dos particulares devem ser o menos lesados possíveis, por força dos meios mais adequados ao fim a atingir. O facto deste princípio ser consagrado logo no artigo do Estado de Direito Democrático (artigo 2º CRP) dá-nos uma ideia de que o texto constitucional português confere uma abordagem bastante aprofundada do princípio a nível do ordenamento interno, para além de que o princípio deve ser tomado em consideração para todas as funções do Estado (ainda que tenha aplicação diversa no seio da função legislativa e da função administrativa), e a proteção dos direitos subjetivos dos cidadãos pelo princípio da proporcionalidade, abrange os vários “direitos e liberdades fundamentais”, a nível económico, social e cultural. Podemos, ainda, denotar que o texto constitucional faz referência à ideia de proporcionalidade em vários preceitos constitucionais como o artigo 18º nº2 CRP, artigo 19º nº4 CRP, 272º nº1 CRP, entre outros. Assim, podemos desde já retirar destes vários textos legais que um dos objetivos do princípio da proporcionalidade é, dentro do possível, a defesa dos direitos e interesses dos particulares, com o objetivo de alcançar um Estado de Direito associado à justiça e à defesa dos direitos dos cidadãos.
Não obstante o seu papel determinante no seio do direito administrativo, e na verdade, é essa abordagem que mais nos interessa, cumpre-nos fazer uma referência do princípio a nível jurídico geral. Na verdade, como defende alguma doutrina, incluindo o Professor Vitalino Canas, foi através da proliferação do princípio no seio do direito administrativo que a ideia de proporcionalidade se alargou aos mais variados ramos de direito, assumindo hoje uma posição de princípio geral de direito, a que nenhum ato estará livre de ser analisado. E até poderemos ir mais longe, na medida em que este princípio teve uma grande proliferação no seio do Direito Comparado, a nível europeu e a nível internacional, o que ajudou na implementação da ideia de proporcionalidade a nível global.
Cabe-nos agora apresentar a definição do conceito do princípio da proporcionalidade, abordando as suas três dimensões: adequação, necessidade (ou proibição do excesso), e proporcionalidade em sentido estrito (ou equilíbrio, ou razoabilidade). Começaremos por definir os critérios abstratos, mais lógicos e teleológicos, porque se definem por uma melhor compreensão, e porque a abordagem das vertentes no princípio da proporcionalidade implica respeitar a ordem dos três testes da forma que foram referidos respetivamente anteriormente. A primeira etapa (adequação) implica que a medida tomada seja causalmente ajustada ao fim que se propõe atingir, ou seja, tem de existir uma relação de causa efeito entre a medida tomada e o fim que se pretende alcançar. Esta etapa apenas determina que a medida tem de ser apta à prossecução do fim a atingir, daí muitos dos casos de violação do princípio da proporcionalidade passarem este primeiro teste. Tomemos como exemplo o caso abordado em sede de aula prática. Imagine-se o caso em que existe uma epidemia grave gerada por uma doença criada e transmitida por pombos, em que é necessário dizimá-los. A primeira medida tomada pelo Governo português é a de matar todos os pombos com um canhão. Atendendo ao princípio da proporcionalidade, na sua vertente da adequação, a conduta é válida. Isto porque o fim é dizimar os pombos e ao usar o canhão consegue-se atingir esse fim e portanto existe uma relação de causalidade entre a medida e o fim. Não obstante à sua validade quanto ao teste da adequação, veremos que esta conduta não é suscetível de passar os seguintes testes do princípio. O segundo critério de abordagem (necessidade) abrange o principal objetivo do princípio em si, como referimos anteriormente, e por essa razão implica um juízo aprofundado e comparativo das várias medidas possíveis idoneamente abstratas a serem tomadas, e o que o princípio vem estipular é a escolha daquela que for menos lesiva para a esfera jurídica dos particulares no caso em questão. Neste sentido e retomando o exemplo anteriormente abordado, veremos que a conduta não passará este segundo teste. O uso do canhão claramente iria provocar outros danos que não a morte dos pombos, danos esses que seriam excessivos e que interfeririam gravemente na esfera jurídica dos particulares. Com certeza existiriam outras medidas que se adequariam e não provocariam danos tão excessivos. Por fim, cabe-nos analisar o último critério de proporcionalidade, que exige um juízo profundo e mais axiológico de ponderação do caso concreto, daí ser mais difícil de compreensão. Esta vertente da proporcionalidade em sentido estrito implica uma valorização dos custos implícitos em comparação com as vantagens obtidas, de acordo com parâmetros materiais. Ou seja, se as vantagens obtidas forem superiores aos custos empregues, o princípio verifica-se como cumprido. Estas três vertentes não funcionam cumulativamente, ou seja, se uma das etapas não se verificar cumprida, o princípio torna-se automaticamente violado no seu todo, acarretando a invalidade do ato em questão.
Tomé Barcelos, 58440
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