Operações materiais administrativas – atuações físicas da Administração no mundo real


Operações materiais administrativas – atuações físicas da Administração no mundo real
   
   O exercício do poder administrativo era desde sempre classificado em 3 categorias: regulamento (ato unilateral normativo), ato administrativo (decisão unilateral de um caso concreto) e contrato administrativo (acordo bilateral produtor de efeitos jurídicos). Surge, recentemente, uma quarta categoria da atuação administrativa: a categoria das operações materiais. Era entendida, até então, como uma categoria isenta de qualquer valor ou relevo jurídico. A necessidade de definir esta nova categoria da atuação administrativa tinha como objetivo primordial o controlo jurisdicional das operações materiais da Administração, isto é, a proteção dos particulares contra operações materiais ilícitas ou ilegais levadas a cabo pela Administração pública.
   Nas palavras do professor Freitas do Amaral, operações materiais consistem em qualquer tipo “de atuação física levada a cabo pela Administração pública, em seu nome ou por sua conta, para conservar ou modificar uma dada situação de facto do mundo real”. Os exemplos são inúmeros: intervenções policiais num terreno para deter suspeitos da prática de um crime; demolição de um prédio que corre o risco de ruina; trabalhos de construção civil para a realização de uma obra pública, etc. Os agentes da Administração pública (polícias, técnicos do Estado, etc.) atuam com vista na modificação/conservação de uma determinada situação de facto.

Existem várias espécies de operações materiais em função de vários critérios:

- Operações materiais instantâneas ou continuadas (em função da estrutura): as operações materiais são instantâneas quando ocorram num único momento; continuadas quando se prolongam no tempo, quer através de uma prestação única quer através de prestações periódicas;

- Operações materiais com vista na conservação ou modificação de uma situação de facto (em função do seu fim): por exemplo, manutenção da ordem pública, defesa militar, etc. Essa modificação/conservação pode ser parcial (por exemplo, a realização de várias obras) ou total (como a demolição de um edifício);

- Operações materiais de gestão pública ou de gestão privada (em função do regime jurídico): as primeiras são tipicamente efetuadas no exercício de poderes públicos ou no cumprimento de deveres públicos (intervenção da GNR ou dos bombeiros, por exemplo), ao passo que as segundas decorrem com base num regime jurídico de direito privado (por exemplo as atividades técnicas de empresas públicas);

- Operações materiais internas ou externas (em função do significado e alcance): as primeiras ocorrem dentro do âmbito da entidade pública que as desencadeia (obras de reparação), ao passo que as segundas atingem (fisicamente) a pessoa ou o património de qualquer outro sujeito de direito (açoes policiais sobre cidadãos, combate de incêndios em propriedade privada). Dentro das operações materiais externas, existem as favoráveis a particulares (por exemplo: proteção policial, pagamento de prestações sociais, etc.) e as desfavoráveis a particulares (posse administrativa de bens expropriados, detenção policial de estrangeiros indocumentados, etc.);

- Operações materiais legais ou ilegais (em função da conformidade com as leis em vigor): a realização de uma operação material deve preencher os requisitos legais para se considerar legal, caso contrário é ilegal. Se forem ilegais, poderão igualmente ser ilícitas se violarem os direitos de um particular sem qualquer fundamento jurídico e, nesses casos, os danos são indemnizáveis a título de responsabilidade da Administração. Se a operação não causar qualquer dano, as consequências são apenas disciplinares ou criminais (em casos graves).

Regime jurídico substantivo das operações materiais administrativas
   O artigo 198º/1 da CRA elenca os 3 princípios fundamentais a que as operações materiais estão sujeitas: o princípio da prossecução do interesse público, o princípio da legalidade e o princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares. Toda a Administração Pública está sujeita a estes 3 princípios. Destes 3 princípios conclui-se que as operações materiais devem:
- Assentar numa habilitação legal prévia, isto é, obedecer à lei;
- Ser ordenadas e efetuadas pelos órgãos ou agentes legalmente competentes para o efeito;
- Em obediência ao princípio da separação de poderes, intervir na solução de conflitos dos particulares apenas quando tais conflitos careçam da intervenção do Poder Judicial;
- Sujeitar-se a todos os princípios constitucionais do Direito Administrativo;
- Respeitar as normas que devam ser tidas em conta em função do tipo de operação material de que se trate (por exemplo, um funcionário público cuja função requeira conduzir um automóvel, este deve respeitar as normas do Código de Estrada e tomar os devidos cuidados).

Regime jurídico procedimental das operações materiais administrativas.
   As operações materiais administrativas podem ser efetuadas tanto no quadro de um procedimento executivo ou no quadro de execução de um contrato da Administração, como fora da exigência desse mesmo procedimento referido inicialmente. Nesta última hipótese, a Administração pública está habilitada a efetuar operações materiais sem que tenha de adotar qualquer procedimento administrativo. Tais situações podem ser:
- Atuação em estado de necessidade: os exemplos mais significativos são os casos dos serviços de bombeiros, ambulâncias, proteção civil, que intervêm sem qualquer procedimento prévio, uma vez que um pedido de socorro consiste numa situação de tal modo urgente e grave que justifica a não adoção de um procedimento administrativo. De qualquer modo, muitos destes casos acabam por estar regulados na lei.
- Medidas policiais de ação direta: estas medidas estão previstas na legislação reguladora das forças policiais de segurança. Grande parte destas medidas não são precedidas de ato administrativo nem seguem os mecanismos de um procedimento administrativo. Acontece, por exemplo, nos casos em que um agente de autoridade presencia a prática de um crime e atua imediatamente para impedir o delito ou deter os suspeitos. A urgência de atuação justifica efetivamente a intervenção administrativa imediata.
- Operações de prestação de serviços públicos: desde logo, os transportes públicos, a distribuição de água, eletricidade, assistência hospitalar, etc. são compostos de operações materiais (condução de veículos, instalação das redes de distribuição…) não precedidas de atos administrativos.


   Devem as operações materiais administrativas ser consideradas como atuações próprias dos indivíduos que as praticam ou tais atuações devem ser imputáveis à própria Administração pública? O professor Freitas do Amaral apoia-se na segunda alternativa. A lei estabelece uma imputação tanto aos atos jurídicos dos órgãos como o faz também para os atos jurídicos e operações materiais provenientes dos agentes de qualquer pessoa coletiva pública.
   De qualquer modo, há que ter em conta os casos que consistem em exceções ao conceito de operações materiais. São eles: os atos (jurídicos) de execução administrativa, declarações negociais no âmbito da execução dos contratos, atos judiciais do processo administrativo (pois o Poder Judicial separa-se da Administração pública) e operações materiais levadas a cabo por particulares (neste contexto, os particulares não atuam em nome da Administração pública).



João Manuel Andrade Morais, 58452
2º Ano, Subturma 17


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