Ato administrativo: Individualidade, Intransmissibilidade e precariedade


Ato administrativo: Individualidade, Intransmissibilidade e precariedade

Conceito de Ato administrativo

Artigo 148º (conceito de ato administrativo)

“Para efeitos do disposto no presente Código, consideram-se atos administrativos as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos externos numa situação individual e concreta.”

Segundo DIOGO FREITAS DE AMARAL, o acto administrativo corresponde a “um ato jurídico unilateral praticado, no exercício do poder administrativo, por um órgão da administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei, e que traduz a decisão de um caso considerado pela Administração, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.”[1]
Assim, segundo o autor, o ato administrativo tem de ser um ato jurídico (conduta voluntária produtora de efeitos), unilateral (provém de um só autor, cuja declaração é perfeita) e no exercício do poder administrativo (ao abrigo de normas de direito público, para o desempenho de uma atividade administrativa de gestão pública). Esta última vertente do ato administrativo gerou uma discussão relativa ao facto de se estar perante um elemento orgânico (ou seja, sendo assim praticado por órgão da administração pública) ou material (no sentido de ser resultante de uma atividade materialmente administrativa), sendo esta última conceção defendida por JOÃO CAUPERS. No entanto, segundo PEDRO GONÇALVES, o legislador intencionalmente omitiu no 148º CPA a referência a estas decisões serem adotadas por órgãos da administração pública, sendo assim perfilhado o elemento material.
            Terá também de se identificar como um acto decisório, na medida em que se trata de um comando imperativo que se projeta na esfera jurídica dos seus destinatários.
Como está previsto no art. 148º, tem um alcance individual e concreto.


Individualidade

O carácter individual ou pessoal do ato administrativo foi integrado em Portugal por MARCELO CAETANO, resultado da noção clássica adotada pela generalidade da doutrina dos países de sistema de direito administrativo de matriz francesa ou alemã. Assim, ainda hoje é aceite na formulação que considera um ato produtor de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
Além da sua consagração expressa no 148ºCPA, a individualidade foi elevada à categoria de elemento formal essencial, na medida que a sua preterição leva à invalidade do ato por vício de procedimento, como está enunciado no 151º/1/b) CPA, consagrando a identificação adequada do destinatário ou destinatários como menção obrigatória do ato.

Intransmissibilidade

Há uma divergência doutrinária em relação à intransmissibilidade do ato administrativo. Segundo PEDRO GONÇALVES, “o carácter intuitu personae – pessoal – impunha a intransmissibilidade”, sendo que “os atos reais criavam situações jurídicas de vantagem não transmissíveis autonomamente: a transmissão destas situações jurídicas revela-se possível, mas tão-somente de uma forma secundária ou acessória em relação à transmissão da coisa[2]
A doutrina clássica não associa expressamente  individualidade à intransmissibilidade do ato administrativo ou vice-versa. Porém, decorrendo da conceção unilateral do ato administrativo, que emana atos individuais e destinados a produzir efeitos jurídicos numa situação concreta, chegou-se à conclusão de que estes não podem extravasar da esfera jurídica do destinatário.
Vasco Pereira da Silva vem referir que, no que toca à intransmissibilidade, esta questão nunca se levantou nem se questiona, porque a unilateralidade do ato e sua individualidade encerravam em si próprias a intransmissibilidade.
Na jurisprudência, apesar de haver uma tendência à intransmissibilidade (com o fundamento da  intransmissibilidade dos atos no seu carácter intuite personae), é feita uma decisão in caso em função da situação que lhe é colocada, havendo acórdãos em que certos atos são considerados transmissíveis.
Segundo PAULO LINHARES DIAS, convém ter em conta que noutros países há muito se autonomizou o estudo da "autorização administrativa", por ser a propósito destes atos administrativos permissivos que se coloca a questão da transmissibilidade.


Precariedade

Este termo, na conceção tradicional, advém da livre revogabilidade do ato administrativo. Ou seja, ao partir do plano de que os atos são pessoais, precários e revogáveis, a precariedade funcionaria como consequência da revogabilidade.
A precariedade foi introduzia na doutrina portuguesa como característica do ato administrativo com MARCELLO CAETANO, definindo os atos precários como “atos que criam situações jurídicas a todo o tempo modificáveis pela vontade da administração, porquanto o poder em que o particular foi investido só existe porque tolerado pela administração.[3]O autor, equipara os atos precários aos atos não constitutivos de direitos, ou seja, aqueles de que não resulta alteração na esfera jurídica de outrem.
Pelo contrário, FREITAS DO AMARAL, não faz referência aos atos precários, quer como classificação dos atos, ou como corolário ou característica dos mesmos.





Rute Romão
nº56709


Bibliografia

-DIOGO FREITAS DE AMARAL, Curso de Direito Administrativo II, 2a Edição, Coimbra, 2011;

-VASCO PEREIRA da SILVA, Em Busca do Ato Administrativo Perdido, Almedina, Coimbra, 2003;

-PEDRO GONÇALVES “Algumas alterações e inovações cientificas no novo Código do Procedimento Administrativo”;

-JOÃO CAUPERS, Introdução ao Direito Administrativo, 10a Edição, âncora;

-PAULO LINHARES DIAS, A Patrimonialidade do Ato Administrativo, Coimbra, 2016;

-MARCELLO CAETANO, “Manual de Direito Administrativo”, 9ª edição, Almedina, Coimbra, 1983.



[1] DIOGO FREITAS DE AMARAL, Curso de Direito Administrativo II, 2a Edição, Coimbra, 2011, 239

[2]  PEDRO GONÇALVES “Algumas alterações e inovações cientificas no novo Código do Procedimento Administrativo”, 240
[3] MARCELLO CAETANO, “Manual de Direito Administrativo”, 9ª edição, Almedina, Coimbra, 1983, 453

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