Competência e forma dos regulamentos


Competência e forma dos regulamentos

A administração publica tem várias formas de fazer uso do seu poder administrativo. No presente texto vai ser abordado o poder administrativo regulamentar.
            Podem ser essencialmente identificados três fundamentos para legitimar este poder. No plano histórico, o exercício do poder regulamentar é fundamentado pela impossibilidade de aplicação rigorosa do princípio da separação de poderes. De acordo com este, todo o poder normativo devia ser desempenhado pela função legislativa, contudo, tal manifestação revelou-se impossível na vertente da praticabilidade. Como tal, acabaria por ser reconhecido à administração o poder regulamentar, inferior ao poder legislativo e exercido dentro de certos limites.
            Este fundamento histórico está inter-relacionado com o fundamento prático. O legislador encontra-se na maioria das vezes numa posição distanciada dos casos concretos da vida social, como tal, se este desempenhasse a função legislativa através da previsão absoluta das normas, diversos problemas, diferenças e injustiças iriam ser positivadas pela falta de conhecimento de todos os aspetos socias que careceram de ser apreciados por este, ainda que sem culpa sua pois não se exige do legislador a omnisciência. De forma a evitar que tal situação ocorra, torna-se mais prático que seja a administração a concretizar normativamente “as condições de aplicação da lei aos casos da vida”[1]. A administração fá-lo através do seu poder regulamentar, concretizando assim a lei, face à posição mais próxima dos particulares que acaba por lhe ser conferida.
            Quanto ao fundamento jurídico, este reside na Constituição e na lei. O poder regulamentar deriva então da Constituição. Relativamente a cada regulamento em particular, o seu fundamento deriva, sim, da lei, uma vez que a cada regulamento tem que ter uma lei habilitante que lhe atribua competência para o desenvolvimento regulamentar. Excetuam-se destes casos os regulamentos internos e os regimentos dos órgãos que, devido ao facto de apenas produzirem efeitos internos à entidade que os estabelece, não necessitam de uma norma habilitadora para que sejam válidos.
            No que à função do regulamento diz respeito, ela encontra-se intrinsecamente relacionada com o poder administrativo enquanto função secundária do estado. Assim os regulamentos devem: executar as leis, complementá-las e dinamizar a ordem jurídica, na perspetiva em que criem disciplinas materialmente inovadoras.[2]
            Relativamente à competência e à forma dos regulamentos, são estas diversas. Há regulamentos do governo, nos quais a regra de a competência é atribuída ao ministro em função da pasta que se visa regulamentar. Esta regra é retirada do 199º/ c) em conjugação com o 201º/2/a). Nestes casos os regulamentos adotam a forma de decretos legislativos regionais. O conselho de ministros também pode em alguns casos dispor de competência regulamentar. Ou quando tal competência lhe seja atribuída por lei, ficando assim ele habilitado, ou quando um assunto seja levado a debate no conselho de ministros e este entenda que deve pronunciar-se sobre o tema. Nestes casos o regulamento adota a forma de resolução do Conselho de Ministros. Já nos casos em que um regulamento seja emanado por um ou mais ministros em nome do governo, este será uma portaria e tem uma forma jurídica própria que é regulada por lei. Pode ainda ser emanado um regulamento por um ministro em nome do seu ministério apenas e nestes casos o regulamento adota a forma de despacho normativo. Todas estas formas são previstas no CPA de 2015, no artigo 138º/3, que estabelece a sua ordem de prevalência, que é igual à que foi supra identificada, ou seja: decreto regulamentar, resolução de Conselho de Ministros, portaria e despacho normativo.
            As regiões autónomas também possuem competência regulamentar nos termos do 227º/1/d) da CRP. Assim a assembleia legislativa regional pode de acordo com os estatutos de cada uma das regiões elaborar regulamentos que vão adotar a forma de decretos legislativos regionais.[3] No que aos regulamentos dos governos regionais dizem respeito estes assumem a forma de decreto regulamentar regional de acordo com os estatutos de cada uma das regiões.
As autarquias locais também possuem de poder regulamentar nos termos do 241º da CRP. Os poderes regulamentares das autarquias não exigem uma lei habilitadora desse poder para cada caso, bastando-lhes invocar a norma que lhes concedeu esse poder regulamentar. Quanto às autarquias paroquiais esse poder cabe ser desempenhado pela assembleia de freguesia, e quanto às autarquias municipais pela assembleia municipal. A forma que eles irão adotar varia em função do objeto que regulam. As mais comuns são as posturas[4].
Os institutos públicos, associações públicas e entidades administrativas independentes podem também ter competência regulamentar em função dos seus estatutos.




BIBLIOGRAFIA

Freitas do Amaral Diogo, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 2016

Rebelo de Sousa Marcelo e Salgado de Matos André, Direito Administrativo Geral, III, D. Quixote, 2010



[1] Cfr. Freitas do Amaral Diogo, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 2016- p. 164
[2] V. Rebelo de Sousa Marcelo e Salgado de Matos André, Direito Administrativo Geral, III, D. Quixote, 2010- pp. 255 e 256
[3] Esta é uma solução criticada por alguns autores, uma vez que estes podem não invocar a norma habilitante, já que não estão compreendidos no 112º/7. É então entendido que “as normas estatutárias criam uma categoria especial de regulamentos que não deve estrita obediência às leis gerais emanadas dos órgãos de soberania”, v. Medeiros Rui/ Pereira da Silva Jorge, Estatuto Político-administrativo dos Açores Anotado, p.130
[4] [4] Cfr. Freitas do Amaral Diogo, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 2016- p. 179



Francisco José Bento Ribeiro, nº 59171

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