Juízos Sobre a Audiência Prévia

Juízos Sobre a Audiência Prévia
Nesta publicação pretendemos uma analise do instituto – audiência prévia- em sede de procedimento do regulamento administrativo, art.100º CPA e em sede de procedimento do ato administrativo art.121º CPA, tendo aqui em conta a conexão operativa que tendencialmente ocorre entre as duas expressões do instituto em causa. Tendo presente que a audiência prévia é um instituto “uno”, uma vez que a “ratio” subjacente à sua consagração é garantir aos interessados a possibilidade de se pronunciaram naquilo que entenderem (matéria de facto e de direito) ser relevante para a decisão final. Ou seja dar aos interessados a possibilidade de participarem/influenciarem o ato da administração durante o procedimento do qual será produto. A audiência prévia resulta portanto dos corolários de uma democracia participativa (art.2º e 267/5 CRP; art.11º e 12º CPA) e das exigências de uma atuação administrativa eficaz (art.5º CPA), pois é a audiência prévia um meio idóneo para garantir que os interesses dos particulares são acautelados, evitando-se, pelo menos potencialmente os casos de impugnação de atos da administração já consumados na ordem jurídica, com todos os custos implicados.
No que respeita a considerações relativas à visão direito/dever e ao impacto na ordem jurídica do instituto em análise remetemos para o que foi referido na anterior publicação.
Passamos então para análise do artigo 100º CPA:
Deste artigo resulta uma importante distinção, com relevo prático, que consiste na diferenciação entre regulamentos mediatos e imediatos.
Os regulamentos imediatos são aqueles que afetam diretamente e sem necessidade de qualquer atuação complementar os direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos (faça-se aqui referencia à alegada inutilidade desta distinção- direitos vs interesses legalmente protegidos-, defendida pelo professor Vasco Pereira da Silva), ou seja, são regulamentos imediatos, aqueles que são exequíveis de per si, não carecem de mediação, nomeadamente de mediação de atos administrativos.
Em sentido contrário, os regulamentos mediatos serão aqueles que carecem de mediação para a total produção dos efeitos jurídicos potenciais.
Cumpre aqui afirmar que a distinção entre regulamentos mediatos vs imediatos não se confunde com a distinção entre regulamentos internos e externos, que resulta desde logo do artigo 135º CPA. É nesse contexto abstratamente compreendida a possibilidade de um regulamento imediato com efeitos externos ou com efeitos internos, pois a distinção regulamentos externos vs internos assenta no potencial ou não de influenciar numa esfera jurídica diferente da pessoa coletiva que adota o regulamento. Esta distinção tem aparente importância pois o regime do CPA apenas pretende regular os regulamentos externos, contudo é de afirmar que em certa medida todos os regulamentos serão externos, acompanhando aqui aquele que parece ser o entendimento do professor regente.
A diferenciação proposta pelo art.100º CPA releva uma vez que da sua interpretação resulta que só os regulamentos imediatos estão sujeitos a audiência prévia, tratando-se portanto de um exercício vinculado. É ainda neste contexto de concluir que a audiência prévia não é afastada no caso dos regulamentos mediatos, simplesmente é conferida à administração discricionariedade de escolha quanto ao seu exercício.
Numa primeira leitura do regime do artigo 100º CPA, poder-se-ia pensar que determinados regulamentos apesar de terem potencial para influenciar terceiros que não a pessoa coletiva adotante, poderiam ser “dispensados” (em sentido improprio) de audiência prévia, sem necessidade de fundamentação, por não serem exequíveis de per si. Mas é precisamente desta ultima “partícula” que resulta o facto de que efetivamente esses efeitos que potencialmente afetarão terceiros não estão à partida isentos do “crivo da audiência prévia”. Isto porque aquilo que acontece com os regulamentos mediatos é que serão complementados/”executados” por atos administrativos, pelo que potencialmente sujeitos ao regime da audiência prévia constante do artigo 121º CPA.
É de notar por um lado que, tendo em conta que os regulamentos são normas e nesse sentido gerais – pluralidade de destinatários- será de aplicação frequente a al. C) do artigo 100º/2 CPA, referente à consulta pública. Por outro lado será de entender que basta que o regulamento em análise contenha uma disposição imediatamente operativa para que esteja potencialmente subordinado ao art.100º/1, sendo nesse sentido o regulamento apreciado na sua globalidade.
Concluímos pela importância da conectividade proporcionada pela sistematização inerente ao código de procedimento administrativo, relevante para assegurar a audiência prévia, a “pequena-grande revolução na nossa ordem jurídica” (pag.293- Curso de Direito Administrativo Vol. II).
Bibliografia
AMARAL, Diogo Freitas do, "Curso de Direito Administrativo", volume II, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2013

Joao Seringa
Nº 58546
Turma: B
Subturma: 17


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