Garantias Administrativas



Em primeiro lugar, importa saber o que se entende por “garantias dos particulares”. Ora, segundo a visão do professor Freitas do Amaral, estas podem ser definidas como «os meios criados pela ordem jurídica com a finalidade de evitar ou sancionar as violações ao direito objetivo, as ofensas aos direitos subjetivos ou dos interesses legítimos dos particulares, ou do demérito da ação administrativa, por parte da administração pública».[1]
A meu ver, entende-se por esta afirmação que as garantias dos particulares vão servir de equilíbrio para que o interesse público seja o primeiro fim a ser prosseguido, bem como que seja garantido que a administração pública tenha como pilar central a legalidade.

Garantias administrativas
De acordo com o professor Freitas do Amaral, as garantias administrativas são aquelas que «se efetivam através da atuação e decisão de órgãos da Administração pública».[2] De início estas garantias denominavam-se de garantias graciosas, visto que a sua concessão seria considerada um favor ao soberano.

Garantias petitórias
Dentro das garantias petitórias temos: o direito de petição; o direito de representação; o direito de queixa; a denúncia e a oposição administrativa.

O direito de petição encontra-se no artigo 52º da CRP. Trata-se da possibilidade dos particulares requererem pedidos à Administração pública à acerca de, por exemplo, informações que possam necessitar de forma a prosseguir os seus interesses. É importante referir que o artigo 52º CRP não especifica concretamente um prazo para que a Administração pública possa dar a sua resposta. Os prazos, regra geral, estão enunciados no CPA. Contudo, pode haver exceções, tais como: imaginemos que um particular fez uma petição e essa petição encaixa-se num determinado procedimento especial que está definido, por sua vez em lei especial. Então, essa petição deverá seguir os prazos que constarem dessa mesma legislação.

A par do que foi mencionado anteriormente, é de realçar que os particulares possuem um direito de informação estabelecido no artigo 268º/1 CRP relativamente ao facto dos particulares puderem saber tanto o estado do seu processo bem como a resolução do mesmo. Importa salientar que relativamente a este tema o prazo (para a Administração pública prestar informações) está expresso no CPA, mais concretamente no seu artigo 82º/3, sendo que é de 10 dias.

Relativamente ao direito de representação, segundo a visão do professor Freitas do Amaral, trata-se da «faculdade de pedir ao órgão administrativo que tomou uma decisão que a reconsidere ou conforme, em vista de previsíveis consequências negativas da sua execução». [3]

O direito de queixa é nada mais nada menos do que a possibilidade de os particulares abrirem um processo que culminará na aplicação de uma sanção a uma entidade que esteja sujeita àquele que é o poder sancionatório da Administração pública. É importante realçar o facto de estar a haver uma queixa de um determinado comportamento e não de um ato.

A denúncia ocorre quando um ou mais particulares dá a conhecer uma situação que necessite de ser averiguada a uma determinada autoridade com a competência para esse efeito.

A oposição administrativa é definida pelo professor Freitas do Amaral como a «contestação que em certos procedimentos administrativos os contra interessados têm o direito de apresentar para combater quer os pedidos formulados por outrem à Administração, quer as iniciativas da Administração que esta tenha resolvido divulgar ao público». [4]

Garantias impugnatórias
As garantias impugnatórias são os «meios de impugnação de atos administrativos perante órgãos da Administração Pública».[5] Temos a reclamação e o recurso.

Ora, atualmente, é possível no nosso ordenamento jurídico haver recurso das omissões. É possível comprovar a natureza facultativa tanto dos recursos bem como das reclamações através do artigo 185º CPA. Foi com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 256-A/77 que foi criada a reclamação necessária. Por sua vez, a reclamação obrigatória findou com a LEPTA em 1985.

O recurso hierárquico, de acordo com o autor João Caupers, trata-se do «pedido de reapreciação do ato administrativo dirigido ao superior hierárquico do seu autor».[6]

Podemos distinguir recurso hierárquico impróprio de recurso hierárquico tutelar. Ora, o primeiro trata-se do «pedido de reapreciação de um ato administrativo dirigido a um órgão da mesma entidade pública a que pertence o autor do ato recorrido e que exerce sobre este um poder de supervisão»[7]. Este pode-se dividir em recurso hierárquico impróprio por natureza e em recurso hierárquico impróprio por determinação da lei e encontra-se no artigo 199º/1 CPA.  Por sua vez, o recurso tutelar consiste no «pedido de reapreciação de um ato administrativo praticado por um órgão de uma entidade pública dirigido a um órgão de outra entidade pública, que exerce sobre aquela um poder de superintendência ou de tutela».[8] O seu caráter é excecional, de acordo com o artigo. Está consagrado no artigo 199º/3,4 e 5 CPA.

Tendo em conta agora o recurso hierárquico obrigatório, Vieira de Andrade salienta quatro vantagens para os mesmos. A principal é o facto da Administração Pública ser obrigada a suspender os efeitos de determinado ato, de acordo com o artigo 189º CPA; a segunda vantagem é o facto deste recurso trazer consigo a possibilidade da busca da tutela judicial (CPA de 2015); de seguida temos o facto de ser possível verificar que, de acordo com o artigo 198º CPA, que a interpretação da decisão no prazo gera a reabertura do mesmo em relação à possibilidade do administrado vir a ingressar com uma ação judicial; por último, mas não menos importante, o autor considera que o prazo deste recurso é uma mais valia pelo facto de ser mais longo.

Os autores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos distinguem o recurso hierárquico em facultativo e em necessário, relacionando-os com um aspeto histórico. Afirmam que a Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (LPTA), «fazia depender a impugnabilidade contenciosa dos atos administrativos do seu caráter definitivo e executório, sendo considerados verticalmente definitivos apenas os atos administrativos praticados por órgãos sem superiores hierárquicos ou por subalternos ao abrigo de delegação de poderes ou no exercício de competências exclusivas».[9]

A queixa ao «Provedor de Justiça»
O provedor de justiça é eleito pelo parlamento e representa uma alta autoridade administrativa. Ora, é a ele a quem se devem dirigir os particulares quando tiverem alguma queixa contra ações ou omissões da Administração pública. Trata-se de um órgão independente e a sua figura está regulada no artigo 23º CRP e na Lei nº 9/91, de 9 de abril (alterada pelas Leis nº 30/96, de 14 de agosto; nº 52-A/2005, de 10 de outubro; nº17/2013 de 18 de fevereiro). Esta lei trata-se do estatuto do Provedor de Justiça. 
Os seus poderes são apenas persuasórios e emite recomendações quando achar necessário dirigidas às autoridades competentes. A vantagem da existência desta figura é o facto de se tratar de uma figura independente e de alta autoridade, eleita pela maioria de 2/3 dos deputados no Parlamento, que goza de um grande prestígio e respeito, o que faz com que a Administração pública tenha sempre em conta as suas recomendações.

Relativamente à Lei nº 9/91, esta apresenta no seu artigo 2º/1 uma dupla extensão relativamente à atuação do Provedor de Justiça, nomeadamente o facto de possuir uma enumeração exemplificativa, permitindo «um maior alargamento do âmbito subjetivo de atuação do Provedor de Justiça»[10]. Por outro lado, inclui as «empresas públicas sob forma societária»[11] que, por sua vez, não possuem poderes específicos que possam contender tanto os direitos bem como as liberdades e garantias dos particulares.

Para o professor Vasco Pereira da Silva, as garantias administrativas trazem consigo um problema que se manifesta no nosso ordenamento jurídico. Ora, em caso de reclamação, quando um particular requer a um órgão administrativo que reconsidere a sua posição, na grande maioria dos casos a Administração não atende a esse pedido. Em regra, confirma a sua decisão tomada em momento anterior.

Segundo a opinião do regente, a melhor opção para tornar as garantias administrativas eficazes seria com a criação de órgãos independentes formados como os tribunals, que são responsáveis pela tomada da primeira decisão (direito anglo-saxónico).

As garantias administrativas possuem outra vantagem, nomeadamente é possível através das mesmas resolver um determinado problema de mérito, ou seja, não precisa de se tratar de uma situação que o particular apenas considere ilegal, mas sim de uma situação que considere injusta. Todavia, o legislador com a reformulação do CPA de 2015 não regulou estas modalidades de garantias administrativas que seriam benéficas para o ordenamento jurídico português, de acordo com o professor Vasco Pereira da Silva.


[1] Diogo Freitas do Amaral, “Curso de Direito Administrativo”, volume II. 3ª edição, Almedina, 2016, página 607.
[2] Diogo Freitas do Amaral, “Curso de Direito Administrativo”, volume II. 3ª edição, Almedina, 2016, página 611
[3] Diogo Freitas do Amaral, “Curso de Direito Administrativo”, volume II. 3ª edição, Almedina, 2016, página 615
[4] Diogo Freitas do Amaral, “Curso de Direito Administrativo”, volume II. 3ª edição, Almedina, 2016, páginas 616 e 617.
[5] Diogo Freitas do Amaral, “Curso de Direito Administrativo”, volume II. 3ª edição, Almedina, 2016, página 618.
[6] João Caupers, “Introdução ao Direito Administrativo”, 10ª edição, Âncora Editora, Lisboa, 2009, página 381.
[7] João Caupers, “Introdução ao Direito Administrativo”, 10ª edição, Âncora Editora, Lisboa, 2009, página 383.
[8] João Caupers, “Introdução ao Direito Administrativo”, 10ª edição, Âncora Editora, Lisboa, 2009, página 384.
[9] Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, “Direito Administrativo- Atividade Administrativa”, Tomo III, 2ª edição, Editora Dom Quixote, 2009, página 222.
[10] João Caupers, “Introdução ao Direito Administrativo”, 10ª edição, Âncora Editora, Lisboa, 2009, página 379.
[11] João Caupers, “Introdução ao Direito Administrativo”, 10ª edição, Âncora Editora, Lisboa, 2009, página 379.



Bibliografia: 

  • CAUPERS, João, "Introdução ao Direito Administrativo", 10ª edição, Âncora Editora, Lisboa, 2009. 
  • REBELO DE SOUSA, Marcelo e SALGADO DE MATOS, André, "Direito Administrativo- Atividade Administrativa", Tomo III, 2ª edição, Editora Dom Quixote, 2009. 
  • FREITAS DO AMARAL, Diogo, "Curso de Direito Administrativo", Volume II, 3ª edição, Almedina, 2016. 
  • Aulas teóricas do professor Vasco Pereira da Silva.

Joana Leonor Leal Nunes 
Nº58436
subturma 17

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