Análise do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de abril de 2012, relativo ao processo nº 0626/11
Análise do acórdão do Supremo
Tribunal Administrativo de 19 de abril de 2012, relativo ao processo nº 0626/11
A análise que segue versa sobre o recurso jurisdicional interposto
da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou
improcedente o recurso contencioso de anulação do despacho do Presidente da Câmara
Municipal de Loulé. O despacho incidia sobre pedidos de informação prévia sobre
a viabilidade de operações urbanísticas num determinado espaço de Quarteira, apresentados
pelos recorrentes. Nesta análises serão abordadas as questões relacionadas com
o procedimento administrativo, informação prévia e audiência prévia, bem como a
fundamentação da decisão, tendo por base o acórdão referido.
Enquadramento das alegações e contra-alegações:
Conclusões dos recorrentes:
O recurso feito fundava-se em várias questões como: violação
do direito de participação dos interessados nas decisões que lhes respeitam
(art. 12º CPA) e do direito de audiência prévia (art. 121º CPA) quanto ao ato
do Presidente da Câmara de Loulé, uma vez que foi decidido que os recorrentes
deveriam esperar pela decisão final. O despacho seria então contrário à lei, violando
também o princípio da legalidade.
Adicionalmente, teriam sido também violadas normas do RPDM de
Loulé, o qual, contrariamente ao pressuposto pelos atos recorridos, não exige
um plano de pormenor como condição de aprovação de um pedido de audiência prévia.
Por último, os recorrentes alegam também a falta de qualquer fundamentação
de facto ou de direito, sendo impossível compreender as motivações que
conduziram à decisão final, o que viola os arts. 152º e 153º CPA.
Por sua vez, o Digno PGA emitiu um parecer no sentido de não provimento
do recurso, por diversos motivos:
·
Quando
à alegação de que a decisão não se encontrava fundamentada, esta não seria
procedente uma vez que o ato era fundamentado por remissão para a informação técnica
elaborada anteriormente pela Divisão de Planeamento e Ordenamento do Território,
dovarante DPOT. De acordo com esta informação o requerimento feito pelos
recorrentes deveria ser indeferido, pois o RPDM proibia as operações urbanísticas
na área de Quarteira a que se referia o pedido
·
Quando
aos procedimentos de informação prévia: só relevaria a decisão da sua não procedência
que consiste, em si, na própria decisão final. O Digno PGA considera que os
recorrentes deveriam ter sido ouvidos no âmbito do procedimento; no havendo motivos
para tal audiência não acontecesse. Assim, a sentença recorrida padeceria de
vicio de forma. Porém, esta preterição não seria suficiente para invalidar a
sentença, uma vez que a decisão de indeferimento era a única possibilidade
viável.
·
O
recurso seria também improcedente quanto à alegada ausência de fundamentação,
tendo em conta que os atos impugnados continham uma remissão para a Informação
Técnica, já referido, pelo que se considera que a sentença se encontrava
suficientemente fundamentada.
Processo de decisão e sentença final:
Os recorrentes são titulares de parcelas de terreno na zona
sobre a qual incidiu a decisão, em Quarteira.
No dia 30 de dezembro de 2002 foi submetido o primeiro requerimento
de aprovação de um pedido de informação prévia referente a uma operação urbanística
que os recorrentes pretendiam realizar na parte de terreno de que eram titulares,
requerimento este feito à Câmara Municipal de Loulé.
Também nesta data foi submetido outro pedido de informação prévia,
por outro dos recorrentes, no âmbito de uma operação urbanística que desejavam
realizar na área de que era titular.
Após o requerimento dos vários recorrentes, em maio de 2003,
os recorrentes foram notificados de que o Presidente da Câmara tinha emitido um
despacho no sentido da Informação Técnica. A 15 de setembro de 2003, o recurso em
causa deu entrada no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa. Após a receção
dos dois requerimentos foi emitido um parecer, o qual remetia para a informação
do DPOT, que tinha sido emitida em abril de 2003.
Face à alegada violação do direito de audiência prévia e de participação:
O referido no art. 121º/1 CPA é que os interessados têm o
direito de ser ouvidos antes da tomada de decisão final; ora, os atos impugnados
não constituem uma decisão final, mas sim uma decisão intermédia de suspensão dos
procedimentos até que se chega a uma conclusão quanto ao estado dos terrenos em
causa, na qual é dito que os recorrentes “deverão aguardar a conclusão do plano”,
ainda neste sentido os pedidos de informação prévia estavam a ser analisados
pela DPOT. Assim, não tinha de ser observado o disposto no art. 121º/1 CPA, não
havia necessidade de proceder a uma audiência dos interessados.
Quanto à invocada inexistência de fundamentação, o STA
considera que os atos se encontram suficientemente fundamentados uma vez que
remetem para a informação técnica já descrita, e esta era de fácil compreensão e
fácil acesso, estando cumpridos os requisitos enumerados no art. 153º/1 CPA.
Sentença final: o Supremo Tribunal Administrativo, atendendo às inferências referidas,
decide pelo não procedimento do recurso administrativo.
Matéria relevante para o caso:
Neste caso estamos perante um procedimento administrativo de
iniciativa particular – art. 53º CPA – uma vez que surge mediante a
apresentação requerimento de entidades privadas à Administração.
Segundo o art. 1º/1 CPA, o procedimento administrativo consiste
numa sequência juridicamente ordenada de atos e formalidades relativos à formação,
manifestação e execução da vontade dos órgãos da Administração Pública. Assim, vemos que o procedimento administrativo
é composto por várias fases, de modo a que a Administração Pública tome a decisão
mais adequada ao caso concreto.
Dentro destas fases inclui-se a fase da audiência dos
interessados, a qual é uma consagração do princípio da colaboração com os
particulares e do princípio da participação dos interessados na tomada de decisões
que lhes digam respeito (art. 11º e 12º CPA). De acordo com esta ideia, o Professor
Freitas do Amaral afirma: “trata-se da fase do procedimento administrativo em
que, […], é assegurado aos interessados num procedimento o direito de
participarem na formação das decisões que lhes digam respeito”[1].
Ao abrigo dos art. 122º/1 e 123º/1 CPA, cabe à Administração
Pública decidir sobre o modo como se processa a audiência, oralmente ou por escrito,
o que revela algum poder discricionário da Administração quanto ao modo de realização
da audiência.
Esta fase é obrigatória em todos os tipos de procedimento, exceto
quando é dispensada pelo art. 124º/1 CPA. Porém, nos termos do nº 2 deste artigo,
na sua decisão final, a Administração tem de apresentar os motivos que levaram
à não ocorrência desta fase. Há alguma divergência doutrinária quanto à sanção aplicável
quando, sendo obrigatória, não se procede à audiência – está em causa uma ilegalidade
por preterição de uma formalidade essencial, mas discute-se se a consequência é
a nulidade ou anulabilidade.
Neste sentido, o Professor Freitas do Amaral, João Caupers e
alguma jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, não elenca a Audiência
dos Particulares como um direito fundamental, pelo que a consequência será a anulabilidade
nos termos do art. 163º/1 CPA. Por outro lado, o Professor Vasco Pereira da
Silva considera que o direito subjetivo público de participação se integra no
elenco dos direitos fundamentais atípicos, pelo que está preenchida a previsão do
art. 161º/2, d) CPA, ou seja, a sanção a aplicar à ilegalidade será a nulidade.
Quanto à Fundamentação da decisão final: esta consiste na explicitação
dos motivos que levaram a Administração a tomar certa decisão. Nos termos do
art. 153º CPA, a fundamentação tem de ser expressa, clara e coerente, devendo
consistir numa exposição em que sejam enumerados os fundamentos de facto ou de
direito que motivaram a decisão. a fundamentação é obrigatória nos casos
legalmente estipulados, bem como nos casos previstos no nº 1 do art. 152º CPA.
De acordo com o professor Rui Machete a funções do dever de
fundamentação são:
·
Defesa
do particular
·
Controlo
da atividade administrativa
·
Pacificação
das relações entre a Administração e os particulares
·
Clarificação
e prova dos factos sobre os quais assenta a decisão
Assim, o dever de fundamentação é um garante de que são cumpridos
os deveres de publicidade e transparência da atividade administrativa.
Há, no entanto, casos de dispensa de fundamentação - casos de
homologação (por o ato já preenche todos os requisitos de fundamentação, ou em
casos onde se trata de ordens dirigidas ao subalterno (não há necessidade de
serem justificadas todas as decisões tomadas).
Por último, nos casos em que a fundamentação seja obrigatória,
e não seja realizada ou não cumpra os requisitos exigidos, estamos perante uma
ilegalidade revestida de anulabilidade nos termos do art. 163º e 153º/2 CPA,
por vício de forma.
Tomada de posição:
Tendo em conta a análise realizado do referido acórdão, a
minha opinião vai ao encontro da decisão proferida pelo Supremo Tribunal
Administrativo. Entendo que atendendo à letra da lei, nas matérias relativas ao
Direito de Audiência Prévia e ao Dever de Fundamentação, o despacho cumpre as exigências
legalmente impostas uma vez que:
i)
A
audiência prévia dos recorrentes não era necessária, pois a decisão em causa não
era uma decisão final, estando ainda em análise os pedidos de informação prévia
ii)
A
decisão estava suficientemente fundamentada uma vez que era feita uma remissão para
a Informação Técnica, o que se pode verificar uma vez que até os recorrentes
demonstraram, nas suas conclusões, ter conhecimento dos motivos que levaram o
Presidente da Câmara de Loulé a emitir o despacho em causa.
Bibliografia:
«http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/203499a6f7671ddf802579f2005423b7?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1» Consultado a 28 de Abril de 2019.
Amaral, Diogo Freitas (1986) Curso de
Direito Administrativo, Volume II, 2ª edição (2011), Almedina.
Caupers, João (2003) Introdução ao Direito
Administrativo, 10ª edição , Âncora Editora.
Realizado por:
Marta Biu
Nº 58678
Subturma 17
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