Alegações dos Advogados de Manuel Sabichão


Exmos. Senhores Doutores Juízes
do Tribunal Administrativo do 2º Ano, Subturma 17, Turma B,
da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Manuel Sabichão, com o CC nº 00000000, NIF 111333444, vem propor a ação de impugnação do ato administrativo, nos termos do artigo 50º do Código de Procedimento nos Tribunais Administrativos e providência cautelar, nos termos do artigo 182º, nº3, do Código de Procedimento Administrativo contra o Ministério da Administração Interna e Ministério do Ambiente.
DOS FACTOS
1º.   É necessária uma acrescida vigilância das florestas para prevenção de incêndios.
2º.   O Secretário de Estado da Administração Interna e o Secretário de Estado do Ambiente abriram um concurso extraordinário para o ingresso de profissionais para preenchimento de cinco vagas na carreira de guarda florestal, nos termos do Aviso n.º 3055/2019.
3º.   O Autor era candidato ao concurso extraordinário para o ingresso na carreira de guarda florestal.
4º.   O Autor (Manuel Sabichão) foi submetido a uma prova de conhecimentos. Nesta prova eram avaliados conhecimentos relativos à divergência doutrinária entre a Escola de Lisboa e a Escola de Coimbra em matéria de Direito do Ambiente.
5º.    O Autor obteve zero valores na prova.
6º.   O Autor não tinha formação jurídica.
7º.   Houve uma alegada participação nos atos de seleção e de graduação dos candidatos, de dois primos, um como Secretário de Estado do Ambiente e outro como seu Assessor
8º.   O Secretário de Estado do Ambiente e o seu assessor demitiram-se na sequência do familygate.
DOS FUNDAMENTOS DE DIREITO
I - Procedimento administrativo
9º.   Há que observar uma série de trâmites, que constituem o procedimento administrativo, de modo a indagar a validade do ato final.
10º.                      Assim, o procedimento administrativo é definido, pelo Senhor Professor Freitas do Amaral, como uma “sequência juridicamente ordenada de atos e formalidades tendentes à preparação e exteriorização da prática de um ato da Administração ou à sua execução”.
11º.                      O ato da administração pode revestir a forma de ato administrativo, de regulamento ou contrato administrativo.
12º.                      No caso concreto, está em causa um ato administrativo traduzido no ato de admissão dos candidatos selecionados. O ato administrativo, contrariamente ao regulamento administrativo, definido no artigo 135º do Código de Procedimento Administrativo (doravante CPA), é individual e concreto, esgotando-se naquele momento.
13º.                      A ser um contrato administrativo, com a concorrência de duas vontades, a administração pública colocar-se-ia numa relação de “paridade” para com os particulares, sendo que estes apresentariam propostas e não candidaturas.
14º.                      Por isto, revela-se imperativo a aplicação das disposições legais constantes do CPA no que toca ao procedimento do ato administrativo.
15º.                      O início do procedimento administrativo correu por conta da Administração, isto é, o “procedimento administrativo inicia-se oficiosamente” (artigo 53º do CPA).
16º.                      Consta do Aviso n.º 3055/2019 que a competência, para o início do concurso ordinário, a culminar com a contratação de 200 guardas florestais foi atribuída à GNR nos termos expostos na subalínea iii), da alínea a) do n.º 2 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 11-A/2018, de 25 de janeiro.
17º.                      Quanto ao concurso extraordinário, ao realizar-se uma remissão para os moldes do concurso ordinário, esta norma não será aplicada. Com isto, e uma vez que os Secretários de Estado não têm competência originária, é necessária a existência de uma norma de delegação de competências dos respetivos Ministros na esfera jurídica dos Secretários de Estado.
II - Princípio da Legalidade
18º.                      O Aviso n.º 3055/2019 constitui um regulamento administrativo nos termos do artigo 135º do CPA.
19º.                      Como tal, encontra-se no bloco de legalidade, vinculando a administração pública (art. 266º/2 da Constituição da República Portuguesa e art. 3º do CPA). Assim, tem de ser respeitado na vertente da preferência de lei, o que parece não ocorrer no procedimento administrativo em questão.
20º.                      Constam do ponto 11.1 do Aviso as normas respeitantes à prova de conhecimentos a prestar pelos candidatos.
21º.                      O Aviso refere que esta prova visa avaliar os conhecimentos e as competências técnicas necessárias para desempenhar a função, mas resta questionar até que ponto o conhecimento de divergências doutrinárias no Direito do Ambiente será um conhecimento necessário para o exercício daquela função.
22º.                      A alínea c) do ponto 3.1 refere que os guardas florestais devem, “no âmbito da missão da Guarda, prestar auxílio a qualquer diligência em matéria legal”. No entanto, a expressão “legal” não se depara como equivalente a “conhecimentos jurídicos”, onde se encontra a doutrina.
23º.                      O facto de Manuel Sabichão não ter sido capaz de fazer esta prova com uma boa classificação não demonstra que este tenha menos habilitações para realizar a função em questão, até porque os restantes concorrentes terem conhecimentos de divergências doutrinárias no Direito do Ambiente não significa que tenham os conhecimentos e competências técnicas necessárias ao exercício da função.
24º.                      Consta do número 4, alínea a) deste ponto quais serão as matérias a serem versadas na prova, sendo referido como base o "conteúdo programático até ao 12º e temas de cultura geral sobre a atualidade...".
25º.                      Assim, uma prova de Direito do Ambiente excede o âmbito de matérias pertencentes ao conteúdo programático até ao 12.º ano, nem se adequa com cultura geral sobre a atualidade, uma vez que estamos num âmbito cognitivo muito específico, aprofundado nos cursos jurídicos, que não possui qualquer relação com os temas lecionados até ao ensino secundário.
III - Princípio da Inderrogabilidade singular
26º.                       O regulamento vincula a atividade administrativa, pelo que um ato individual e concreto, resultado do procedimento, tem de se conformar às normas gerais e abstratas anteriormente concebidas (art. 142º/2 do CPA).
IV - Princípio da Proporcionalidade
27º.                      Atualmente encontram-se doutrinal e jurisprudencialmente assentes as três vertentes (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) que o princípio da proporcionalidade, constante do art. 7º do CPA, comporta.
28º.                      Assim, o meio de avaliação dos candidatos, revela-se adequado e idóneo ao fim que se pretende obter, no sentido em que funciona como um método de seleção dos candidatos.
29º.                      No entanto, não é necessário. Há que ter em conta os interesses que estão em colisão ao nível da situação concreta e optar pelo menor prejuízo. Uma prova que remete para divergências doutrinárias, dentro de um âmbito muito específico de um domínio jurídico, não se revela necessário junto dos interesses que devem ser prosseguidos no exercício da profissão de guarda florestal, não se revelando um domínio necessário de avaliação.
30º.                      Sendo os pressupostos cumulativos encontra-se violado o princípio da proporcionalidade na vertente da necessidade. Não obstante, o teste da razoabilidade traz à colação a ideia de ponderação de custos e benefícios.
31º.                      Como consequência, o ato é anulável pela regra geral constante do artigo 163º/1 do CPA.
V - Princípio da Imparcialidade
32º.                      A Administração Pública encontra-se vinculada ao cumprimento do princípio da imparcialidade. Este princípio está consagrado no art. 9.º CPA e pretende assegurar que a Administração Pública, na tomada das suas decisões, atende a critérios meramente objetivos de interesse público, devidamente adequados ao cumprimento das suas funções específicas, não se tolerando, por conseguinte, que estes venham a ser alterados ou distorcidos por interesses alheios às respetivas funções, como interesses pessoais, de grupos sociais, partidos políticos ou até mesmo interesses políticos concretos do Governo.
33º.                       Assim, os órgãos administrativos devem agir de forma isenta relativamente aos interesses em jogos nas situações relativamente às quais estes devem tomar uma decisão ou se pronunciar sobre um determinado assunto, ou seja, não podem ter interesse direto nessa mesma decisão.
34º.                      A vertente negativa deste princípio diz-nos que  a imparcialidade traduz a ideia de que os órgãos e agentes administrativos não podem intervir em procedimentos, atos ou contratos que digam respeito a questões do seu interesse pessoal, da sua família ou de pessoas com quem tenham relações económicas de especial proximidade, de forma a que não se possa suspeitar de uma eventual isenção da sua conduta. A lei ordinária aprofunda este dever de não intervir em certos assuntos para não haver suspeita de parcialidade nos arts. 69.º e 76.º CPA.
35º.                      Por seu turno a vertente positiva traduz a ideia de que a Administração Pública tem o dever de ponderar todos os interesses públicos secundários e os interesses privados legítimos, equacionáveis para o efeito de determinada decisão, antes da sua respetiva adoção. Esta obrigação de ponderação comparativa implica um limite à discricionariedade administrativa, porquanto resulta desta obrigação a exclusão que comporta qualquer valoração de interesses estranhos à previsão normativa.
36º.                      Neste caso concreto, poderemos por em causa uma violação do princípio da imparcialidade na vertente negativa, pois, apesar de os adjuntos, assessores e chefes de gabinete serem considerados pessoas de confiança dos titulares dos respetivos cargos, estes exercem, além de uma função política, uma função administrativa. No exercício da sua função administrativa, a lei permite que estes exerçam competências que são delegadas pelo Governo, enquanto órgão da Administração Pública.
37º.                      Deste modo, um Secretário de Estado que se encontre diretamente envolvido numa determinada situação, não pode nomear alguém com quem tenha uma relação de proximidade, para exercer competências, de forma a não podermos suspeitar de uma eventual falta de imparcialidade. No entanto, para que as consequências possam ser devidamente aplicadas, é necessário verificarmos se há um eventual caso de impedimento, escusa ou suspeição, através da aplicação dos arts. 69.º e ss. do CPA.
38º.                      Na vertente negativa existem situações de impedimento (art. 69º do CPA) e situações de escusa (casos em que a lei dá ao órgão ou agente administrativo o direito de pedir escusa de intervenção naquele procedimento) ou suspeição (art. 73º do CPA).
39º.                      No que respeita à suspeição a substituição não opera de forma automaticamente obrigatória. Nestes casos os particulares, interessados no processo, têm o direito de opor suspeição ao órgão que é normalmente competente, solicitando a sua substituição.
40º.                      Quem decide se há ou não fundamento para suspeição é o órgão competente. Se decidir que não, continua em funções e tem legitimidade para intervir no procedimento. Caso contrário, é elaborada uma declaração de suspeição e o órgão ou agente é substituído (art. 75º do CPA).
41º.                      Embora menos numerosos do que os casos de impedimento, os casos de suspeição encontram-se patentes, de forma não taxativa, no art. 73º/1 do CPA.
42º.                      Deste artigo resulta que os titulares de órgãos da Administração Pública e respetivos agentes, bem como quaisquer outras entidades que, independentemente da sua natureza, se encontrem no exercício de poderes públicos devem pedir dispensa de intervir no procedimento de um ato ou contrato de direito público ou privado da Administração Pública quando ocorra circunstância pela qual se possa com razoabilidade duvidar seriamente da imparcialidade da sua conduta ou decisão.
43º.                      Ora, atendendo ao facto de o Secretário de Estado do Ambiente e o seu respetivo assessor serem primos, os quais possuem, por conseguinte, uma relação de proximidade, conduzindo à aplicação do art. 73º/1 do CPA, é razoável duvidar da imparcialidade da sua conduta, pois essa mesma relação de proximidade pode influenciar as decisões tomadas no ato de nomeação dos guardas florestais, bem como em todo o procedimento.
44º.                      Como o assessor interveio no procedimento, através da prática de determinados atos essenciais ao mesmo, bem como o Secretário de Estado do Ambiente, é possível concluir que ambos intervieram conjuntamente num procedimento que, devido à sua proximidade, pode levar a uma suspeição das suas decisões.
45º.                      Havendo uma suspeição, o facto de o Secretário de Estado do Ambiente e o seu respetivo assessor se terem demitido, vem salientar ainda mais este facto, pois esta demissão, concretamente, é considerada, uma assunção de culpa, em termos políticos. Deste modo, ao tomarem a decisão de se demitirem em consequência da sua relação de proximidade, nada obsta a que ambos acarretem as devidas consequências a nível administrativo.
46º.                      Existe um conjunto de sanções que são aplicadas quando a atuação da Administração Pública viola o princípio da imparcialidade. A sanção será a anulabilidade, por força do art. 163º do CPA, quando os atos em que intervieram titulares de órgãos ou agentes impedidos (vertente negativa) ou em relação ao impedimento relativo (suspeição), são atos anuláveis por serem ilegais, e para tal, podem ser levados a tribunal para se obter a sua anulação, segundo o art. 76º/1 CPA, sendo que a atividade dos titulares dos órgãos e os agentes vai ser suspendida e há a substituição imediata.
VI - Princípio do aproveitamento do ato administrativo
47º.                      Interessa começar por considerar a alínea a) do n.º 5 do artigo 163.º do CPA. Relativamente a esta alínea, diremos que a mesma tem um âmbito de aplicação claro que se traduz na aplicação do princípio do aproveitamento do ato relativamente a atos vinculados ou àqueles relativamente aos quais se encontre reduzida a zero a sua discricionariedade.
48º.                      Podemos dizer que nesta alínea se encontram previstas as situações em que a lei confere ao interessado o direito a um ato administrativo com determinado conteúdo, mas também aquelas em que embora sob discricionariedade administrativa, o caso concreto permite identificar apenas uma solução como legalmente admissível, por existir apenas uma solução juridicamente validada, não concedendo margem para uma decisão alternativa.
49º.                      No que concerne ao tipo de ilegalidades que aqui estão em causa, trata-se de vícios de fim (erro de facto e erro de qualificação dos factos) e vícios formais (vícios de procedimento e vícios de forma).
50º.                      A alínea b) do n.º 5 do artigo 163.º do CPA circunscreve a sua previsão às situações em que haja a violação de regras formais ou procedimentais, em razão da instrumentalidade dessas regras.
51º.                      Finalmente, temos a alínea c) do n.º 5 do artigo 163.º do CPA, que consagra o afastamento do efeito anulatório para os atos discricionários. O que interessa nesta alínea é o apuramento de que não existe um nexo causal entre a ilegalidade cometida e o conteúdo da decisão final.
52º.                      O problema deste artigo 163.º/5 prende-se no entendimento que o legislador português adotou sobre o procedimento administrativo. Questiona-se se a norma contida no referido artigo é realmente razoável, será que realmente faz sentido aplicar esta norma vivendo nós num Estado moderno de Direito, será que o juiz pode perante um ato ilegal, anulável, considerar que não há nenhum problema em desrespeitar as regras procedimentais desde que se comprove que o ato teria sido praticado de forma idêntica, ao caso de se ter sido respeitado o procedimento?
53º.                      Ora a doutrina maioritária segue este entendimento da autonomia subalternizada do procedimento em relação às formas de atuação administrativa, da qual resulta, que para eles estas questões estão respondidas pela forma positiva, no entanto atualmente existe parte da doutrina, como os Senhores Professores André Salgado Matos, Vasco Pereira da Silva e Marcelo Rebelo de Sousa, que contesta este entendimento, pois segundo eles, a posição da doutrina maioritária consagrada no art.163.º/5 coloca em causa a importância do procedimento, ao considerar que as invalidades das decisões administrativas podem ser ultrapassadas.
54º.                      Outro problema suscitado por este artigo prende-se com a sua relação com a lei constitucional. Segundo o legislador alemão, o dito princípio do aproveitamento do ato administrativo encontra-se limitado pelo direito fundamental procedimental, que confere um estatuto jurídico aos cidadãos que lhes permite atuar em defesa destes mesmos direitos concedidos pela Constituição, e apenas se aplica em casos de anulabilidade e não nos casos de nulidade.
55º.                      O legislador português aplicou o mesmo na ordem jurídica portuguesa. Ora, segundo esta teoria, qualquer direito fundamental implica uma garantia de procedimento, os particulares têm de ter direito a participar, direito a fundamentação das decisões administrativas e direito a audiência previa. Não é possível aplicar uma decisão administrativa que afete um direito fundamental. Disto resulta que se um ato for inválido porque no momento do procedimento ocorre um vicio que violou um destes direitos fundamentais, então o ato não pode ser aproveitado com base no 163.º/5, pois tal se apresentaria como uma violação da lei constitucional. Assim sendo, a norma do 163.º/5, deste ponto de vista apresenta-se como inconstitucional ao permitir que sejam desrespeitadas as regras procedimentais.
56º.                      Ora, para que o art.163.º/5 seja realmente aplicado, será necessário por um lado limitá-lo para que não se torne inconstitucional, isto é, limitá-lo a um conjunto de soluções mínimas em que não esteja em causa direitos fundamentais procedimentais e direitos fundamentais substantivos, e mesmo nos casos em que não haja uma lesão dos direitos fundamentais, deve-se adotar uma conceção restritiva sob pena de estarmos a violar a constituição e a lei.
NULIDADE
I - Dever de fundamentação
57º.                      A figura do dever de fundamentação surge após o 25 de abril de 1974 e visa reforçar as garantias dos particulares. Veio a tornar-se figura obrigatória.
58º.                      O CPA exige o dever de fundamentação relativamente aos atos que afetem interesses legalmente protegidos (art. 152º/1/a)) do CPA.
59º.                      A audiência prévia dos interessados antes da decisão está consagrada como princípio geral de direito e contribui para um alargamento do dever de fundamentação pois a indicação do sentido provável da decisão tem de ser fundamentada, a indicação de inexistência de audiência prévia tem de ser fundamentada e por fim a proposta de decisão elaborada tem de ser fundamentada.
60º.                      A fundamentação é uma formalidade importante para o particular lesado pela atuação administrativa, para o tribunal competente para ajuizar da validade do ato e ainda para o interesse público. Segundo o Senhor Professor Rui Machete o dever de fundamentação tem quatro funções:
a.      Defesa do particular;
b.      Controlo da administração;
c.       Pacificação das relações entre a Administração e os particulares;
d.      Clarificação e prova dos factos sobre os quais assenta a decisão.
61º.                      Os atos administrativos que vêm elencados no art. 152º do CPA, exigindo imperativamente fundamentação (alíneas do número 1), são atos que de algum modo podem lesar direitos e interesses de terceiros.
62º.                      O dever de fundamentação está regulado nos arts. 152º a 154º do CPA e merece referência constitucional no art. 268º/3, 2º parte do CPA.
63º.                      Para o caso, verifica-se o pressuposto constante de alínea a) do artigo 152º/1 do CPA na medida em que há direitos ou interesses legalmente protegidos que vão ser negados, sendo, por isso exigido o dever de fundamentação.
64º.                      O dever de fundamentação é um elemento formal do ato administrativo que surge ao lado da audiência prévia e da notificação dos interessados.
65º.                      Com base no art. 153º do CPA a fundamentação deve ser expressa, de facto e de direito (indicando as regras jurídicas que impõe ou permitem a tomada de decisão e explicando, igualmente, em que medida é que a situação sobre a qual incide se subsume às previsões normativas das regras aplicáveis) e a fundamentação dever ser clara, coerente e completa.
66º.                      Se a fundamentação não é compreensível será tida como obscura, se for compreensível em si mesma, mas não for pressuposto lógico da decisão então é contraditória. A fundamentação será ainda insuficiente quando não for bastante para explicar a decisão.
67º.                      A falta de indicação dos fundamentos, a sua obscuridade, contradição ou insuficiência equivalem à sua falta o que terá repercussões no plano da validade.
68º.                      Existem dois casos em que o dever de fundamentação não é exigido: o ato administrativo consistir numa declaração de concordância, pois o ato ao qual se refere essa dita concordância já terá sido justificado e os fundamentos daquele serão os fundamentos deste; Atos orais, pois estes, regra geral, não contêm fundamentação. Assim haverá duas hipóteses: ou o ato é reduzido a escrito numa ata, ou a lei dá aos interessados o direito de requerer a redução a escrito da fundamentação dos atos orais.
69º.                      O regime de nulidade aplica-se aos atos em que falte qualquer dos elementos essenciais.
70º.                      O dever de fundamentação é um elemento essencial. Esta ideia decorre do artigo 41º, número 2, alínea c) da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia que refere que a obrigação por parte da administração de fundamentar as suas decisões é um direito.
71º.                      O artigo 268º, número 3 da CRP faz também alusão à necessidade de fundamentação “expressa e acessível” dos atos administrativos havendo, assim, uma previsão constitucional do dever de fundamentação.
72º.                      A todos deve ser permitido o acesso aos tribunais, se a decisão não está fundamentada o particular não tem conhecimento dos pressupostos e vê restringido este direito. Em função desse conhecimento ter-se-ia o direito de contestar o ato. Não é possível invocar falta de competência se não houver fundamentação, pois não existe conhecimento do regime ao abrigo do qual o ato foi praticado. Se o particular não tem acesso às questões de facto e de direito vê o seu direito de acesso aos tribunais administrativos diminuído (artigo 20º da CRP).
73º.                      Como tal, o dever de fundamentação constitui um direito fundamental. Ao ser violado no presente caso acarreta a nulidade do ato administrativo nos termos do art. 161º/2/i) do CPA.
Do valor da causa
            Valor: 300 mil euros
Da prova testemunhal
            Gervásio Alves dos Ramos
            Josefa Egídio de Calado

Nestes termos deverá a ação ser julgada por Vossas Excelências procedente por provada.

Os advogados
·         Cristina Reis – nº 58548
·         Joana Leal Nunes- nº 58436
·         Rodrigo Dias- nº 58545
·         Giovana Lacerda- nº 57582
·         Lucca Maia- nº 57600
·         Sofia Sousa- nº 58441
·         Maria Luísa Cró- nº 58434
Nota: Tratando-se de uma hipótese meramente académica, procuramos realizar algo que se assemelhasse a um verdadeiro documento de Alegações de julgamento. Contudo, consideramos importante a colocação neste modelo de todas as explicações que ponderamos aquando da feitura deste trabalho, sob pena do mesmo se tornar excessivamente resumido e incompleto.
Colocamos neste nosso escrito a possibilidade, que existia, do ato administrativo em questão ser considerado anulável, apenas porque consideramos relevante esta informação, contudo a nossa solução resume-se à nulidade do presente ato com base nos Fundamentos de Direito apresentados no ponto 26 e seguintes.










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