A Retroatividade dos Regulamentos Administrativos



            No antigo Código de Procedimento Administrativo (CPA posterior a 2015) a retroatividade dos regulamentos não estava regulada, o que provocou uma discussão doutrinária sobre este assunto. Segundo o Professor Marcelo Rebelo de Sousa “são em regra proibidos os regulamentos retroativos. A estatuição de efeitos normativos para o passado não pode considerar-se implícita na norma que confere uma habilitação, antes implicando uma habilitação específica”[1]. Ou seja, o Professor considera que para um regulamento administrativo ter eficácia retroativa a lei tem que assim o determinar. Por outro lado, o Professor Diogo Freitas Amaral considera que existe uma proibição da retroatividade dos regulamentos, mas, segundo este, a esta proibição “… escapam, naturalmente, os regulamentos em relação aos quais a lei haja concedido à Administração a faculdade de regular retroativamente. Constitui igualmente exceção o caso de o regulamento administrativo que se pretenda aplicar retroativamente consagrar um regime mais favorável para os destinatários, se nenhum particular ou entidade pública for ilegalmente prejudicado”[2]. Portanto, para o Professor Marcelo Rebelo de Sousa só eram permitidos regulamentes com eficácia retroativa se a lei assim o permitisse, enquanto que, para o Professor Diogo Freitas Amaral os regulamentos com eficácia retroativa eram permitidos caso a lei assim o consagrasse e caso estes trouxessem um regime benéfico para o particular, sem, obviamente, prejudicar um outro particular ou entidade pública.
            O artigo 141 do novo CPA veio regular esta situação, pode-se retirar do seu número 1 que a retroatividade dos efeitos dos regulamentos é legalmente admissível nos casos em que o seu conteúdo não seja desfavorável ao administrado, nos termos e nas situações expressamente enunciadas no mesmo preceito. O número 2 deste artigo vem advertir que, porém, os efeitos do regulamento não podem reportar-se a data anterior aquela a que se reporta a sua lei habilitante. Penso que o CPA acabou por acolher uma solução idêntica à do Professor Diogo Freitas Amaral, pois admite a retroatividade dos regulamentos que adotem soluções mais benéficas aos particulares, desde que não afetem ilegalmente outros particulares ou entidades públicas.
            O Professor Carlos Blanco Morais levante uma questão pertinente sobre esta matéria. Este pergunta qual a solução a adotar caso uma lei, atribuir às suas próprias normas eficácia retroativa e fixar encargos deveres e sujeições aos destinatários, sem que, contudo revista caráter sancionatório ou fiscal ou restrinja direitos liberdades e garantias, prevendo a sua concretização por regulamento de mera execução. O professor diz que para além de, obviamente, a lei poder ser submetida a fiscalização da constitucionalidade deve se entender à luz do princípio da proteção da confiança “… que os regulamentos que se limitam a executa-la podem perfeitamente ter natureza retroativa sob pena de inviabilizarem a aplicação da lei. As leis de conteúdo desfavorável, fora dos casos em que a sua retroatividade se encontra interdita pela Constituição, deixariam de poder ser retroativas por força de impossibilidade dos regulamentos que as servem poderem ter efeitos com o mesmo alcance temporal. Trata-se de uma solução de retroatividade consequente, juridicamente, admissível, que é aceita pela jurisprudência administrativa (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17/12/1998)”.[3]


[1] MARCELO REBELO DE SOUSA, Direito Administrativo Geral II, 2ª Ed (2009), 252.
[2] DIOGO FREITAS AMARAL, Curso de Direito Administrativo II, 2ª Ed (2011), 212.
[3] CARLOS BLANCO MORAIS, Novidades em Matéria da Disciplina dos Regulamentos no Código de Procedimento Administrativo, 39.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Os vários tipos de atos administrativos

O regulamento externo e interno

Caso Prático Direito Administrativo:Tópicos Correção